segunda-feira, 28 de junho de 2010

Das tristes heranças

Quando era criança, sempre que chegava a casa da minha avó, ouvia, baixinho o rádio dizer: oi gente. A Vera, que trabalhava lá, passava o dia ouvindo Eli Correa. Devo confessar que eu até gostava daquela voz. Achava um pouco divertido ouvir o programa comendo bolo de cenoura na mesa da cozinha.

Quando a minha avó morreu, o Eli Correa continuou nas minhas tardes: assim que eu chegava da escola, passava o dia com o meu avô. Mas o meu avô também morreu. E a Vera veio trabalhar em casa. E então, a voz que antes era tão agradável começou a me incomodar: tinha alguma coisa errado e ela não deveria estar ali. Mas os dias foram passando, a tristeza e a saudade foram atropeladas pelo cotidiano e eu acostumei. Acordava todos os dias e não me incomodava mais. Não me divertia quando com os bolos de cenoura, mas a rádio Capital deixou de ser minha inimiga.

Hoje, quando eu acordei, aquela voz estava lá, inconfundível. Mas, me desculpe Eli Correa, desta vez eu não vou acostumar.

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