quinta-feira, 23 de junho de 2011

O guarda

Como sempre cheguei quase atrasada na escola. Era terça feira e chovia em São Paulo. E claro que eu não tinha guarda chuva, nem capa. Por sorte, encontrei um lugar na porta. Quer dizer, naquele momento eu achava que era sorte. Foi a baliza mais rápida que eu fiz na vida: se corresse, teria tempo para um café antes da aula.

Durante o dia tudo correu bem. Depois do almoço, fui até o carro. E qual a minha surpresa ao virar a esquina? Dois guardas estavam na frente do carro. Meus joelhos começaram a tremer. Eu sabia que não poderia ter problema, tinha parado em local permitido e meus impostos estavam em dia. Mas confesso: tenho medo de polícia. E eles não pareciam felizes: davam voltas em torno do veículo, abaixavam procurando alguma coisa, colocavam a cara no vidro para investigar o interior. E aos poucos, fui me aproximando. Fosse o que fosse eu deveria enfrentar.

- Olá - eu disse, receosa.
- Esse carro é seu? - perguntou o guarda, nada simpático.
- S-s-i-i-m - gaguejei. Não seria melhor ir para casa de ônibus?
- Porque essa carreta é roubada. - E nesse momento percebi a carreta. Tinha chegado com tanta pressa que não tinha percebido.
- É?
- É, roubaram a carga e largaram a carreta aqui. O carro é seu mesmo?
- Sim.
- Porque eles está na frente da carreta roubada e pensamos que ele fosse roubado também. - Hein? Alguém pode me explicar qual a lógica utilizada pelos simpáticos policiais? Será que eles achavam que o cliozinho era capaz de guinchar uma carreta de 100 toneladas?
- Não, não é roubado. É meu.
- Mas olha só a bagunça! Ele é o perfeito carro roubado. Está cheio de livros soltos, tem um pé de tênis na frente e a palheta do limpador está levantada.

Fiquei com vontade de explicar para ele como era a vida de uma professora, que carregamos muito material, e usamos muitos livros que são pesados. Dizer que naquele dia eu tinha chegado atrasada, que não tinha guarda chuva, nem capa, e não tinha percebido a palheta, porque desliguei o carro correndo. Contar que com as tristezas da vida e com a ansiedade do mestrado eu tinha engordado uns quilos, então que eu estava jogando futebol e que se ele procurasse bem o outro pé do tênis - que na verdade era uma chuteira - estava lá, no banco de trás. E que ele não tinha nada com isso, que ele deveria cuidar do bem estar das pessoas e não se preocupar com a organização do meu carro. Mas não disse nada do que eu pensei. Me restringi a um abafado:

- Me desculpe. Não conta pra minha mãe?

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