sábado, 27 de junho de 2009

Memória de peixe, memória de elefante

Vou sempre com uns amigos da escola em um bar. 2as feiras, depois da reunião. Um dia, pedi para o garçom:

- Tem copo pequeno de cerveja? Se tiver, eu prefiro.
- Claro - e logo me trouxe um.

Na semana seguinte, fomos novamente ao bar. O garçom era o mesmo, e antes que eu pedisse, trouxe o copo pequeno, apenas para mim. Fiquei radiante! Nossa, como ele poderia lembrar? O bar estava cheio, o garçom deveria atender muitas pessoas e suas idiossincrasias todas as semanas, como poderia lembrar da minha? E todas as pessoas da mesa tiveram que ouvir a minha felicidade por alguns minutos.

Eu fiquei realmente comovida com a história. E com outros amigos, em outro bar, contei para todos. E um dele respondeu:

- Ah, é aquele garçom que lembra de tudo?
- Hein?
- É, naquele bar da esquina, todo mundo conhece ele no bairro... tem memória de elefante.

Meu mundo caiu. Não eu não era especial. Era ele e sua maldita memória. Parei de frequentar o bar, em protesto. Mas em uma outra segunda-feira, cedi e voltei. Ele estava lá, sorridente.

- Nossa, faz tempo que você não vem...
- Tenho trabalhado muito - não iria cair no golpe novamente! Eu também tinha boa memória...
- É, mas seus amigos continuraram vindo, estão ali. - e apontou a mesa. Mas essa era fácil, vai.

Sentei. E logo veio ele com o copo pequeno de cerveja. E olhou para mim com uma expressão que dizia "viu, eu não esqueci". E nesse instante, meu coração amoleceu e eu esqueci todo meu desapotamento e me senti querida novamente. Sorri, feliz da minha memória de peixe, que me deixa esquecer algumas coisas.

domingo, 21 de junho de 2009

Um dia, um gato

Desde que eu consigo lembrar vou ao cinema com a minha madrinha. Passamos por várias fases, os infantis, os juvenis e eu logo cheguei a fase preferida dela: os filmes com histórias elaboradas e personagens sofridos. Os filmes de gente grande.

Dos mais antigos, tem um que foi o mais marcante. Um dia, um gato. Acho que era esse o nome do filme. Ela se cansou de desenhos e historinhas bobas e resolveu me levar para um filme daqueles difícies de entender. Pelo menos para uma criança de oito anos. Lembro que era história de um gato, que via as pessoas em cores diferentes para cada característica, azul para inveja, vermelho para raiva e assim por diante e isso causava uma grande confusão na comunidade. Lembro bem que o filme não fez o menor sentido para mim naquela época.

Então, o filme voltou em cartaz. E lá fomos nós novamente, a minha madrinha é assim, quando ela acha que você deve gostar de alguma coisa... Não desiste. Eu tinha crescido um pouco, mas o filme continuava um mistério para a minha compreensão. Não conseguia entender como alguém poderia gostar tanto, e por tanto tempo, de uma história tão sem graça. Ainda mais alguém que nunca gostou de gatos.

Hoje, fui ao cinema com a minha madrinha mais uma vez. O filme não foi surpresa, o espanto é que agora ela cuida de um gato. "Branco, de olhos azuis." E mais uma vez fiquei confusa. Sempre me surpreendo e me encanto com as pessoas que conseguem, assim, de repente, fazer coisas tão diferentes da vida. Como, por exemplo, passar a gostar de gatos. As vezes acho que nasci sem essa capacidade.

O filme de hoje era triste, triste. Daqueles que até o choro sofre e não consegue sair. Os preferidos da minha madrinha. Eu não, gosto de filmes com final feliz. Daqueles que a gente chega a enjoar de tanta felicidade. Gosto da entorpecência que o cinema traz para a amargura da realidade. O nosso cotidiano já basta de tanta dificuldade.

Acho que a vida é uma grande desilusão com momentos de pequenas felicidades. Como ir ao cinema com a minha madrinha.

segunda-feira, 8 de junho de 2009

Eu, meu pijama e a novela

Tenho ido para a cama cedo nos últimos tempos. Trabalho demais, frio demais, disposição de menos. Semana passada não foi diferente, e às nove horas eu já estava na cama. Foi quando de repende, eu ouvi uma música bem baixinha, lá longe e eu não me incomodei. Mas a música foi aumentando. E a minha paciência diminuiu. Xinguei meu vizinho, quem era ele para colocar uma música àquela altura? Praguejei contra a sua felicidade, segunda-feira e aquela alegria? Mas meu mau-humor durou pocou e logo se transformou em pânico. O barulho vinha da minha casa.

Mas essa não é uma história de terror, a minha história é com celular. Um celular, especificamente. Um celular, como muitos outros, quebrado, trocado e esquecido. Pois é, faço parte desse mundo descartável onde trocar de aparelho é mais barato do que consertá-lo. Meu telefone caiu no chão, e a tela de cristal líquido se tornou um painel psicodélico de arte contemporânea. Por algum tempo me diverti com o novo "brinquedo", mas não há espaço para a arte quando falamos em telefonia. Apesar do visor ter ficado mais bacana, com a queda não conseguia dizer quem me ligava, ou ler mensagens, ou mesmo verificar se tinha discado o número correto. E depois de um tempo o celular teve o destido de outros: a caixa dentro do armário. E ficou lá, esquecido.

Mas na segunda-feira passada resolveu voltar a vida e me pregar uma peça. Demorei para perceber que o som vinha do quarto ao lado, de dentro do armário, de dentro de uma caixa com "materiais didáticos", coisinhas que eu insisto em guardar com a esperança de usar em alguma aula.

Passado o pânico, veio a curiosidade. Por que o maldito celular resolvera tocar tanto tempo depois? Seria algum mistério extra-mundano? O "espírito zombeteiro"? Mas como boa física, procurei uma explicação mais sem graça e mais plausível: o celular tinha sido programado para tocar naquele horário.

O problema é que eu não tinha nenhum compromisso para aquele dia. Mas o que teria sido tão importante no ano passado para que eu, com medo do esquecimento, programasse o celular para tanto tempo depois? Fiquei um pouco melancólica com o fracasso do meu planejamento, porque mesmo com alarme, esse dia foi somente eu, meu pijama e a novela.

terça-feira, 2 de junho de 2009

Das profissões que não deveríamos ter

Até hoje eu brinco de "o que você quer ser quando crescer". Tá bom, não sou criança, e já tenho profissão, duas até, se quiser contar diplomas. Mas gosto dessa idéia de poder pensar que a qualquer momento tenho a chance de ser outra pessoa. Porque eu realmente acredito que somos, em parte, definidos por aquilo que fazemos.

Já quis ser poeta, bailarina, fotógrafa. Mas, nas minhas brincadeiras estão fora todas as profissões relacionadas à saúde. Nunca, nunca, nunca quis ser médica. Nem enfermeira, nem mesmo psicóloga (ou pessecóloga, para alguns...). Nunca.

Ontem, chegando a escola, vi um acidente de moto. Uma moto, dois passageiros. Cairam, assim, como diria a minha vó "de maduros", então não foi nenhum acidente muito feio. Mas só estava eu na rua, então fui ajudar os acidentados. Eles pareciam bem, não tinham batido a cabeça (aprendi com a minha mãe: sempre verifique se bateu a cabeça, o resto é... resto). Ofereci uma água. "Vamos até a escola, é ali ó". Fomos.

Eles ficaram na porta, com a moto. Entrei na escola. Oi, um copo. Brigada. Voltei. Eram dois e eu tinha levado um copo. De novo na escola. Oi, outro copo. Brigada. De novo à porta. Um deles sangrava. Escola, secretária. Oi tem antisséticobandeidgaseataduraqualquercoisaqueomoçocaiudemotonaportadaescolaeeunaoseioquefazer? Calma, respira. O que você quer? Não sei. Não sabia mesmo. Queira ter chegado atrasada, não ter visto nada daquilo. Meus olhos encheram da lágrimas e minhas mãos tremiam. Respirei. Eu quero um spray e gases.

Porta, moço com a mão sangrando. Meu deus do céu, porque esse spray não funciona?! Funcionou. Meu deus do céu, porque a minha mão não pára de tremer, como eu vou dar o nó nessa gase? Consegui. Ufa, ufa, ufa. Eles foram embora, e eu agradeci ser professora.

Foi então que eu lembrei, que mesmo sendo professora, de vez em quando tem um engraçadinho que resolve, acidentalmente, arrancar um pedaço do dedo com o estile. Na sua primeira aula. E aí você tem que engolir o choro e segurar a mão.Porque quando isso acontece dá um aperto forte no coração, eu fico sem saber o que fazer. E, então, as vezes eu ainda brinco de "o que você quer ser quando crescer".

segunda-feira, 1 de junho de 2009

Metáfora

O aquário é mesmo o reflexo da minha vida. Até as pragas morreram.

Não fossem os poliquetas, e uma única estrela do mar manca, não sei o que seria de mim.